Viva o poeta !
Um bom trago para homenageá-lo.

Roberto Piva faleceu aos 72 anos, de falência múltipla dos órgãos. Tinha câncer na próstata e mal de Parkinson. Piva se refugiava na rua das Palmeiras, no seu pequeno apartamento abarrotado de livros. Homossexual , o poeta sabia que viveria sempre à margem das panelinhas literárias.
Sampavelox do delírio de Piva.
Roberto Piva era fora da lei mesmo, um outsider lírico.

Piva tornou-se fundamental na poesia brasileira desde 1963, quando lançou Paranoia, poemas-instântaneos da metrópole cinza, brutal e surpreendente. O livro foi reeditado no ano passado pelo Instituto Moreira Salles e é uma bela edição.
Paranoia é totalmente alucinógeno. Como toda a produção de Piva. São imagens inoculadas com seringa de vidro, dói prá caramba. Nenhum verso, porém, é vulgar, nenhuma imagem é estranha. Principalmente prá quem vive em sampavelox, essa cloaca fedida.
Roberto Piva leu tudo de Antonin Artaud, William Blake, Rimbaud, Breton , toda a obra de Reich, Jung e Freud.
Sempre as imagens do inconsciente , onde incluia
Xamanismo, Umbanda, Cosmogonia Indígena.

A Editora Globo lançou , em 2005, toda a obra poética de Piva.


Meus pés sonham suspensos no Abismo
minhas cicatrizes se rasgam na pança cristalina
eu não tenho senão dois olhos vidrados e sou um órfão
havia um fluxo de flores doentes nos subúrbios
eu queria plantar um taco de snooker numa estrela fixa
na porta do bar eu estou confuso como sempre mas as galerias do
meu crânio não odeiam mais a batucada dos ossos

colégios e carros fúnebres estão desertos
pelas calçadas crescem longos delírios
punhados de esqueletos são atirados ao lixo
eu penso nos escorpiões de ouro e estou contente
os luminosos cantam nos telhados
eu posso abrir os olhos para a lua aproveitar o medo das nuvens
mas o céu roxo é uma visão suprema
minha face empalidece com o álcool
eu sou uma solidão nua amarrada a um poste
fios telefônicos cruzam-se no meu esôfago
nos pavimentos isolados meus amigos constroem um manequim fugitivo
meus olhos cegam minha mente racha-se de encontro a uma calota
minha alma desconjuntada passa rodando.

*Boletim do Mundo Mágico



* Imagem via La Coleccionista

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| Por Prensada | segunda-feira, 5 de julho de 2010 | 10:36.